Virola surinamensis (Roll. ex Rottb.) Warb.

Ucuúba, bicuíba, mucuíra

Árvore inerme, heliófila,perenifólia a subcaducifólia, dioica, de até 30 m de altura 60 cm de DAP. Tronco geralmente retilíneo, com esgalhamento (sub)verticilado e sapopemas na base. Casca moderadamente espessa; ritidoma  amarronzado a pardacento, sulcado ou apenas fendilhado; casca interna avermelhada, passando a brancacenta na região do floema, exsudando seiva de cor âmbar quando cortada . Madeira leve a moderadamente pesada; cerne variando de bege a marrom-avermelhado. Râmulos roliços, geralmente longos, glabrescentes a ferrugíneo-tomentosos. Folhas simples, alternas, dísticas; pecíolo canaliculado, de 5-15 mm de comprimento; lâmina  (sub)coriácea, glabrescente na face superior, tomentosa a pubérula na inferior, de 10-15 x 4-6 cm, estreitamente ovada, oblonga ou elíptica; base sub-cordada, arredondada ou obtusa; ápice agudo, acuminado ou cuspidado; margem inteira. Inflorescências (sub)axilares, laxifloras, amareladas, pilosas ou glabrescentes; flores pediceladas, pilosas, unissexuais, monoclamídeas, actinomorfas, perfumadas, de 3-5 mm de comprimento, com perigônio trímero, fendido até a base. Inflorescências masculinas paniculiformes, de 8-12 cm de comprimento; flores em fascículos de 5-20 unidades, com androceu constituído por 3 estames concrescidos. Inflorescências femininas fasciculadas, de até 5-8 cm de comprimento; flores solitárias ou em grupos de 3-10 unidades, com ovário súpero, unilocular e uniovulado. Frutos pedunculados, tomentosos a glabrescentes, (sub)globosos, monospermos, deiscentes, de 15-20 mm de diâmetro. Sementes (sub)globosas, marrom-claras, estriadas, oleaginosas, de 10-15 mm de diâmetro, com arilo vermelho, carnoso, oleoso, longitudinalmente dividido.

Distribui-se da Costa Rica à Bolívia e ao Brasil, passando por parte do Caribe e por todo o norte da América do Sul. É uma das espécies mais importantes da bacia amazônica, devido às suas utilidades para a população e à sua elevada frequência nas florestas de áreas inundadas e de várzeas dessa região. A sua inclusão no rol de espécies do Cerrado está baseada em registros efetuados em florestas ribeirinhas da faixa de transição deste bioma com o Bioma Amazônia, nos estados de Mato Grosso, Tocantins e Maranhão, e do contato do Cerrado com as formações da faixa costeira do estado do Piauí.

Floresce na estação seca ou nos períodos de menor ocorrência de chuvas, mas pode florescer na época de chuvas constantes. Apresenta frutos maduros ao longo de quase todo o ano, com destaque para os meses da estação chuvosa. As flores são frequentadas por dípteros, lepidópteros e himenópteros, com destaque para abelhas, mas ainda existem controversas sobre os seus polinizadores. As sementes são dispersas por marsupiais, primatas e aves, especialmente tucanos, e pela água das linhas de drenagem.

A madeira é usada para confeccionar caixas, urnas funerárias, assentos para móveis singelos, molduras, laminados, contra placados e forros de casas; e existem estudos que apontam como bastante apropriada para fabricação de polpa para papel. As flores masculinas fornecem pólen e as femininas fornecem néctar aos seus visitantes. As sementes fornecem um óleo que quando se densifica passa a se chamar “gordura (ou sebo) de ucuúba” e é bastante utilizado na Amazônia como sucedâneo do querosene, para fabricar velas e sabão, e para debelar afecções cutâneas, aftas, cólicas e dores nas articulações; estudos em laboratório levaram à constatação de que esse produto tem potencial para fabricação de cosméticos, remédios  biodiesel. A resina exsudada pela casca do tronco é usada contra erisipela e para desinflamar as hemorroidas. O arilo das sementes é um recurso alimentar importante para vários membros da fauna arborícola, com destaque para tucanos, que têm presença marcante nas árvores com frutos maduros. As sementes que caem no chão entram na dieta de animais terrestres. A espécie é indicada para formação de bosques em margens de lagoas, recomposição de florestas em terrenos encharcados e plantios para obtenção de madeira mole e de gordura (ou sebo) de ucuúba.

Para a formação de mudas de V. surinamensis, pode-se  adotar, em linhas gerais, os procedimentos  preconizados para S. sebifera e S. urbaniana,  quais sejam: 1) utilização de sementes novas, livres do arilo e lavadas em água corrente; 2) semeadura em sementeiras ou em recipientes individuais, em ambiente com 50% de sombreamento; e 3) utilização de substrato constituído por uma mistura de terra argilo-arenosa com esterco curtido, na proporção 1:1. Com base no exposto para essas duas espécies, pode-se esperar uma taxa de germinação da ordem de 30% a 50% e um prazo de 30 a 50 dias para as plântulas começarem a emergir. Pode-se esperar também que o crescimento das plântulas e dos indivíduos juvenis varie de moderado a rápido.

V. surinamensis é um elemento florístico comum na Amazônia que ocorre em algumas florestas ribeirinhas da faixa setentrional do Cerrado. Ainda não existem avaliações sobre o seu status de conservação nesse bioma, mas segundo  o CNCFLORA (2019), as avaliações de risco de extinção existentes a colocam como Deficiente de Dados (DD) no Brasil e como Em Perigo (EN) na sua imensa área de dispersão.

Distinção da espécie

V. surinamensis pode ser distinguida de V. malmei, V. sebifera e V. urbaniana pela área de dispersão, tendo em vista que, no Cerrado, está limitada a algumas parte dos estados do Piauí, Maranhão, Tocantins e Mato Grosso. Pode ser distinguida também  pelas folhas, que são mais compridas e estreitas e menos pilosas do que as dessas suas congenéricas.

Indivíduo em floresta ribeirinha. Miracema do Tocantins (TO), 26-11-2019

Superfície do rititoma. Miracema do Tocantins (TO), 26-11-2019

Folhas (faces abaxial e adaxial). Miracema do Tocantins (TO), 26-11-2019

LITERATURA
ANDERSON, A.B. et al. 1994. Impactos ecológicos e sócio-econômicos da exploração seletiva de Virola no estuário amazônico: implicações para politícas florestais brasileiras. Rio de Janeiro: WWF, 76p.
BERG, M.E. van den. 1982. Plantas medicinais da Amazônia: contribuição ao conhecimento sistemático. Belém: CNPq/CPTU, 223 p.
BORGES, F.C. et al. 207. Potencial alelopático de duas neolignanas isoladas de folhas de Virola surinamensis (Myristicaceae). Planta Daninha, v.25, n.1, p.51-59.
CARDOSO, M.A. et al. 1994. Germinação de sementes de Virola surinamensis (Rol.) Warb. (Myristicaceae) e Guarea guidonia (L.) Sleumer) (Meliaceae). Revista Brasileira de Sementes, v.16, n.1, p.1-5.
CESARINO, F. 2006. Ucuúba-branca – Virola surinamensis (Rol. ex Rottb.) Warb, Informativo Técnico Rede de Sementes da Amazônia, n.14 [online]. Disponível em: <http://www.iepa.ap.gov.br/arquivopdf/itucuubabranca.pdf>, acessado em: 11 jun. 2019.
CNCFlora. Virola surinamensis in Lista Vermelha da flora brasileira versão 2012.2 Centro Nacional de Conservação da Flora. Disponível em <http://cncflora.jbrj.gov.br/portal/pt-br/profile/Virola surinamensis>. Acesso em 8 junho 2019.
CRUZ, H. da S. 1997. Reflorestamento de virola (Virola surinamensis) e andiroba (Carapa guianensis), em ecossistema de várzea, Vila Lusitânia, Afuá-PA. Belém: FCAP, 4p. (FCAP. Projeto Várzea. Nota Técnica, 6).
CUNHA, R. et al. 1992. Efeito do dessecamento sobre a viabilidade de sementes de Virola surinamensis (Rol) Warb. Revista Brasileira de Sementes, v.14, n.1, p.69-72.
GALUPPO, S.C & CARVALHO, J.O.P. 2001. Ecologia, manejo e utilização da Virola surinamensis Rol. (Warb.). Belém: Embrapa Amazônia Oriental, 38 p. (Documentos, 74).
GURGEL, E.S.C. et al. 2006. Virola surinamensis (Rol. ex Rottb.) Warb. (Myristicacaceae): aspectos morfológicos do frutos, semente, germinação e plântula. Boletim Museu Paraense Emílio Goeldi – Ciências Naturais, v.1, n.2, p.37-46.
HOWE, H.F. & KERCKHOVE, G.V.A. 1981. Removal of wild nutmeg (Virola surinamensis) crops by birds. Ecology, v.62, n.4, p.1093-1106.
HOWE, H.F. & RICHTER, W.M. 1982. Effects of seed size on seedling size in Virola surinamensis; a within and between tree analysis. Oecologia, v.53, n.3, p.347-351.
JARDIM, M.A.G. & MOTA, C.G. 2007. Biologia floral de Virola surinamensis (Rol.) Warb. (Myristicaceae). Revista Árvore, v.31, n.6, p.1155-1162.
LEMOS, J.M. 1974. Reflorestamento com Virola surinamensis (ucuúba de várzea) na Ilha do Marajó. In: CONGRESSO FLORESTAL BRASILEIRO, 2. Anais… Curitiba: FIEP, p.109-111.
LIMA, J.D. et al. 2006. Efeito da luz no crescimento de plântulas de Virola surinamensis (Rol.) Warb. Revista Científica Eletrônica de Engenharia Florestal, n. 8.
LIMAS, J.D. et al. 2007. Germinação e armazenamento de sementes de Virola surinamensis (Rol.) Warb. (Myristicaceae). Revista Árvore, v.31, n.1, p.37-42.
LOPES, N.P. et al. 2004. Biosynthesis of tetrahydrofuran lignans in Virola surinamensis. Revista Brasileira de Ciências Farmaceuticas, v.40, n.1, p.53-57.
LORENZI, H. 1992. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. Nova Odessa (SP): Editora Plantarum, v.1, 1a ed., 352 p.
LOUREIRO, A. et al. 1979. Essências Madeireiras da Amazônia. Manaus: INPA, v.2, 187 p.
MOTA, R.V. & FRANÇA, L.F. 2007. Estudo das características da Ucuuba (Virola surinamensis) e do Inajá (Maximiliana regia) com vistas à produção de biodiesel. Revista Científica da UFPA, v.6, n.1, p.1-9.
OLIVEIRA, S.M. 2020. Virola in Flora do Brasil 2020. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://reflora.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB19795>. Acesso em: 09 ago. 2021.
PINÃ-RODRIGUES, F.C.M. 1999. Ecologia reprodutiva e conservação de Virola surinamensis (Rol.) Warb. na região do estuário amazônico. Tese (doutorado), Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 260p.
PIÑA-RODRIGUES, F.C.M.; PEREIRA, C.C.F. Comportamento germinativo de sementes de Virola surinamensis (Rol.) Warb. em diferentes estádios de maturação. Informativo Abrates, v.3, n.3, p.110, 1993.
RODRIGUES, W.A. 1972. A ucuúba de várzea e suas aplicações. Acta Amazônica, v.2, n.2, p.29-47.
RODRIGUES, W.A. 1980. Revisão taxonômica das espécies de Virola Aublet (Myristicaceae) do Brasil. Acta Amazônica (Suplemento), v.10, n.1, p.5-127.
Site Protection is enabled by using WP Site Protector from Exattosoft.com