Hymenaea stigonocarpa Mart. ex Hayne

variedades stigonocarpa

e

brevipetiolata N. Mattos

Jatobá, jatobá-do-cerrado, jataí, jutaí

Árvore inerme, caducifólia, heliófila, monoica, resinífera, até 15 m de altura e 50 cm de DAP. Tronco curto ou longo e reto ou tortuoso. Casca espessa; ritidoma de superfície cinzenta a pardacenta, muito dividida e descamante; casca interna vermelha a vermelho-rosada. Madeira pesada; cerne marrom, em grande parte das vezes com faixas escuras. Râmulos cinzentos a castanho-claros, glabros ou pubescentes.  Folhas alternas bifolioladas, glabras ou pilosas; raque de 1,5-3 cm de comprimento; folíolos falcados a ovado-oblongos, de bordo liso, coriáceos glabros ou pilosos, com 8-14 x 6-10 cm e com pontuações translúcidas contendo resina. Inflorescência corimbiforme, articulada, glabra ou pilosa, com 10-20 flores e 8-15 cm de comprimento. Florcs diclamídeas, pentâmeras, andróginas, perfumadas, de 2-3 x 1,5-2 cm; sépalas acinzentadas, pilosas; pétalas brancas, glabras. Fruto seco, indeiscente, assimétrico, roliço ou achatado, apiculado ou não. com 4-8 x 10-16 cm e 4-10 sementes; epicarpo castanho, marrom ou negro, verruculoso ou liso, às vezes com resina solidificada na superfície; mesocarpo lenhoso; e endocarpo pulverulento, amarelado, de odor pronunciado, envolvendo as sementes. Sementes orbiculares,  ovoides ou elipsoides, marrons, lisas, duras, de 1,8-2,2 x 1,4-2,8 cm.

H. stigonocarpa ocorre, representada pelas variedades citadas no título deste post, no Paraguai, Bolívia, Venezuela e Brasil. A variedade stigonocarpa é a mais dispersa no Brasil, com registros de ocorrência para os estados de São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Ceará, Piauí, Maranhão, Tocantins, Pará e as unidades federativas da região Centro-Oeste, enquanto a variedade brevipetiolata possui registros apenas para esta região e para Minas Gerais. Ambas habitam cerrados e cerradões relacionados tanto a solos argilosos, quanto a arenosos e a litólicos.

Essa fabácea perde as folhas na estação seca, ficando desfolhada durante 2 a 4 meses; floresce de novembro a abril; e apresenta frutos maduros quase um ano após a floração. As flores são de antese noturna e polinizadas por morcegos, e talvez  também por mariposas. Durante o dia ocorrem visitas de beija-flores e de himenópteros, com destaque para abelhas. As sementes são predadas por coleópteros e por mamíferos terrestres que percorrem os cerrados à noite, em busca de alimento. Suspeita-se que esses mamíferos são dispersores eventuais das sementes.

A madeira de H. stigonocarpa se assemelha com as de H. courbaril e H. martiana, mas devido ao pequeno comprimento e à tortuosidade do tronco da maioria dos indivíduos, é mais usada para construir cercas e pequenas edificações no meio rural e para confeccionar cochos, móveis rústicos, peças para carros de bois e objetos decorativos, dentre outros artefatos. O tronco emana uma seiva vermelha ou amarelada, a qual atribuem propriedades  fortificantes e afrodisíacas e muitas vezes é usada contra afecções pulmonares, na forma de xarope. A infusão da casa do tronco é usada na fitoterapia popular, como fortificante, cicatrizante, antigripal, antitérmico, vermífugo e contra úlceras estomacais. A casca fornece, mediante cocção, uma tintura avermelhada que é usada no tingimento artesanal de fios de algodão. As flores são fonte de néctar para morcegos, beija-flores e insetos. A polpa pulverulenta dos frutos é apreciada por vários membros da fauna silvestre (cutia, paca, anta, porco-do-mato, veado-mateiro etc.) e por algumas pessoas, que a consomem in natura e sob a forma de mingau, bolo e biscoito. A casca dos frutos e as sementes são utilizadas em confecção de artesanatos. A resina do tronco e dos frutos pode ser usada na fabricação de vernizes, mas no cotidiano os seus principais usos é como cicatrizante de feridas e no tratamento de laringite, faringite, reumatismo, afecções urinárias e fraturas ósseas, na forma de cataplasma. A espécie se presta para arborização urbana e recomposição de cerrados desmatados, e deve ser preservada nos seus habitats naturais, para fins de extração de frutos e resina, além de empregada em formação de pomares de fruteiras não convencionais.

Para formar de mudas de H. stigonocarpa, utiliza-se sementes completamente livres da polpa que as envolvem e que sejam novas ou que tenham sido conservadas em embalagens herméticas por no máximo 4 meses. Para uma germinação mais rápida e uniforme, é necessário escarificar as sementes, friccionando-as em um abrasivo de textura fina (p. ex., lixa d’água 220) ou fazendo leves cortes na superfície do tegumento. A semeadura deve ser realizada em recipientes de no mínimo 30 x 15 cm, contendo terra argilo-arenosa misturada com esterco curtido na proporção de 1:1. Os recipientes devem ser mantidos em ambiente com 20% a 30% de sombreamento, até que as plântulas atinjam em torno de 10 cm de altura; depois, deve-se retirar o sombreamento e mantê-las a céu aberto. Em algumas situações pode-se realizar a semeadura direta, em covas abertas na área a ser repovoada pela espécie.

A variedade típica de H. stigonocarpa possui ampla dispersão, ocorre, muitas vezes, em terrenos inadequados  para atividades agropastoris e conta com populações em várias unidades de conservação de proteção integral nesse bioma. A variedade brevipetiolata é menos dispersa, mas também ocorre nesses tipos de terrenos e de unidades de conservação.

Chave para distinção das variedades de H. stigonocarpa

1. Folíolos glabros em ambas as faces ou pubérulos na face abaxial; pecíolo glabro, de 15-35 mm de comprimento ……. var. stigonocarpa

1′. Folíolos tomentos na face abaxial ou em ambas faces; pecíolo tomentoso, de 5-6 mm de comprimento ……………………….. var. brevipetiolata

Chave para distinção das espécies de Hymenaea com ocorrência confirmada no Cerrado

 (Em construção)

 Comentário: Boniface et al.( 2017) referiram-se a Hymenaea como um grupo de plantas no qual já foram identificadas mais de uma centena de compostos orgânicos, incluindo ácidos graxos, flavonoides, terpenoides, esteroides, ácidos fenólicos, fitailidas, procianidinas e cumarinas. Afirmaram também que algumas evidências experimentais confirmaram que extratos dessas espécies podem ser efetivos quando usados contra desordens respiratórias, asma, diarreia e algumas infecções microbianas, mas que ainda falta informação sobre os mecanismos de ação e segurança dos compostos existentes nesses extratos.

Indivíduo em cerrado denso desbastado para uso como pastagem. Campo Alegre (GO), 15-03-2014

Superfície do ritidoma e cor da casca interna. Abadia dos Dourados (MG), 11-02-2020

Flores e botões florais. Planaltina (DF), 05-02-2008

Frutos. Coromandel (MG), 08-09-2013

 LITERATURA
ALMEIDA, S.P.; SILVA, J.A. & RIBEIRO, J.F. 1990. Aproveitamento alimentar de espécies nativas dos Cerrados: araticum, baru, cagaita e jatobá. Planaltina (DF): EMBRAPA-CPAC, 83 p.
ALMEIDA, S.P.; COSTA, T.S.A. & SILVA, J.A. 2008. Frutas nativas do cerrado: caracterização físico–química e fonte potencial de nutrientes. In: SANO, S.M.; ALMEIDA, S.P. & RIBEIRO, J.F. (eds.), Embrapa Cerrados. Cerrado: ecologia e flora. Brasília (DF): Embrapa Informação Tecnológica, v.1, p.353-381.
ALMEIDA, S.P. et al. 1998. Cerrado: espécies vegetais úteis. Planaltina (DF): EMBRAPA-CPAC, 464 p.
BONIFACE, P.K. et al. 2017. Current state of knowledge on the traditional uses, phytochemistry, and pharmacology of the genus Hymenaea. Journal of Ethnoipharmacoloy, v.206, p.193-223.
BOTELHO, S.A. et al. 2000. Aspectos morfológicos de frutos, sementes, plântulas e mudas de jatobá-do-cerrado (Hymenaea stigonocarpa Mart. ex Hayne) – Fabaceae. Revista Brasileira de Sementes, v.22, n.1, p.144-152.]
CIPRIANO, J. et al. 2014. O gênero Hymenaea e suas espécies mais importantes do ponto de vista econômico e medicinal para Brasil. Caderno de Pesquisa, Série Biologia, v.26, n.2, p.41-51.
DECHOUM, M.S. 2004. Crescimento inicial, alocação de recursos e fotossíntese em plântulas das espécies vicariantes Hymenaea courbaril var stilbocarpa (Hayne) Lee & Lang. (jatobá) e Hymenaea stigonoc arpa Mart. (jatobá-do-cerrado) (Leguminosae-Caesalpinioideae). Dissertação (mestrado). Universidade Estadual de Campinas, 164 f.
DUBOC, E. et al. 1996. Nutrição do jatobá (Hymenaea courbaril L. var. stilbocarpa (Hayne) Lee et Lang.). Cerne, v.2, n.1, p.138-152.
CUNHA-SILVA, G.R. et al. 2012. Dados biométricos de frutos e sementes de Hymenaea courbaril var. stilbocarpa (Hayne) YT Lee & Langenh e H. martiana Hayne. Revista Biotemas, v.25, n.2, p.121-127.
FERREIRA, M.B. 1980. Plantas portadoras de substâncias medicamentosas, de uso popular nos cerrados de Minas Gerais. Informe Agropecuário, v.6, p.19-23.
GIBBS, P.E. et al. 1999. Postzygotic control of selfing in Hymenaea stigonocarpa (LeguminosaeCaesalpinioideae), a bat-pollinated tree of the Brazilian cerrados. International Journal of Plant Science, v.160, p.72–78.
HERINGER, E.P. & FERREIRA, M.B. 1975. Árvores úteis da região geoeconômica do DF: jatobá, o gênero Hymenaea. Cerrado, v.7, n.27 p.27-32.
HIRSCHMANN, G.S.; ARIAS, A.R. 1990. A survey of medicinal plants of Minas Gerais, Brazil. Journal of Ethnopharmacology, v.29, p.159-172.
LEE, Y.T. & LANGENHEIM, J.H. 1975. Systematics of the genus Hymenaea L. (Leguminosae, Caesalpinioideae, Detarieae). Berkeley :University of California, 109 p. (University of California Publications in Botany, v.69).
LORENZI, H. 1992. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas brasileiras. Nova Odessa (SP): Instituto Plantarum, v.1, 1a ed., p.156.
MORAES, M.L.T. & SEBBENN, A.M. 2011. Pollen dispersal between isolated trees in the Brazilian Savannah: a case study of the neotropical tree Hymenaea stigonocarpa. Biotropica, v.43, n.2, p.192-199.
MORAES, M.L.T.; KAGEYAMA, P.Y. & SEBBEN, A.M. 2007. Sistema de reprodução em pequenas populações fragmentadas e em árvores isoladas de Hymenaea stigonocarpa. Scientia Forestalis, v.74, p.75-86.
MORENO, M.A. et al. 2009.  Estrutura genética espacial em populações de Hymenaea stigonacarpa Mart. ex Hayne mediante a utilização de marcadores microssatélites cloroplastidiais. Scientia Forestalis, v.37, n.84, p.513-523.
OLIVEIRA, D.M.T. 1999. Morfologia de plântulas e plantas jovens de 30 espécies arbóreas de Leguminosae. Acta Botânica Brasílica, v.13, n.3, p.263-269.
ORSI, P.R. et al. 2012. Hymenaea stigonocarpa Mart. ex Hayne: a Brazilian medicinal plant with gastric and duodenal anti-ulcer and antidiarrheal effects in experimental rodent models. Journal of Ethnopharmacology, v.143, n.1, p.81-90.
PESTANA, L.T.C. 2010. Estudo taxonômico de Hymenaea L.: complexo H. courbaril, H. martiana e H. stigonocarpa (Fabaceae: Caesalpinioideae: Detarieae). Dissertação (mestrado). Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. 38 p.
PINTO, R.B. 2017. Systematic studies in the Hymenaea clade and a taxonomic revision of the genus Hymenaea L. (Leguminosae, Detarioideae). Tese (doutorado), Universidade Estadual de Campinas, 201 p.
PINTO, R.B.; TOZZI, A.M.G.A. & MANSANO, V.F. 2020. Hymenaea in Flora do Brasil 2020. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://reflora.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB28134>. Acesso em: 07 ago. 2021.
QUEIROZ, L.P. 2009. Leguminosas da Caatinga. Feira de Santana (BA): Universidade Estadual de Feira de Santana∕Kew Gardens, 467 p.
RIZZINI, C.T. & MORS, W.B. 1995. Botânica econômica brasileira. São Paulo: Âmbito Cultural, 2a  ed., 248 p.
SALOMÃO, A.N. et al. 2003. Germinação de sementes e produção de mudas de plantas do cerrado. Brasília: Rede de Sementes do cerrado, 96 p.
SANO, S.M. & FONSECA, C.E.L. 2003. Estabelecimento de progênies de jatobá (Hymenaea spp.) em plantios puros no cerrado. Planaltina (DF): Embrapa Cerrados, 14 p. (Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento, 110).
SANO, S.M.; AGOSTINI-COST, T.S. & FARIA, J.P.. 2016. In: VIEIRA, R.F. et al. (eds.). Espécies nativas da flora brasileira de valor econômico atual ou potencial: Plantas para o futuro: Região Centro-Oeste . Brasília: Ministério do Meio Ambiente, p.247-256.
SCABORA, M.H. et al. 2011. Associação micorízica em espécies arbóreas, atividade microbiana e fertilidade do solo em áreas degradadas de cerrado. Ciência Florestal, v.21, n.2, p. 289-301.
SILVA, M.R.; SILVA, M.S. & CHANG, Y.K. 1998. Utilização da farinha de jatobá (Hymenaea stigonocarpa Mart.) na elaboração de biscoitos tipo cookie e avaliação de aceitação por testes sensoriais afetivos univariados e multivariados. Ciência e Tecnologia de Alimentos, v.18, n.1, p.25-34.
SILVA-JÚNIOR, M.C. 2005. 100 árvores do cerrado: guia de campo. Brasília: Rede de Sementes do Cerrado, 279 p.
SOUZA, I.M.; FUNCH, L.S. & QUEIROZ, L.P. 2016. Flora da Bahia: Leguminosae – Hymenaea (Caesalpinioideae: Detarieae). Sitientibus série Ciências Biológicas, v.16, p.1-18.
VELOSO, V.R.S.; SILVA, M.F. & ALMEIDA, L.G. 1994. Levantamento dos insetos associados ao jatobá (Hymenaea sp.) no cerrado goiano. In: I REUNIAO ESPECIAL DA SBPC, Uberlândia(MG), 1994. Anais. O cerrado e o século XXI: o homem, a terra e a ciência. Uberlândia (MG): UFU/SBPC, p.8.
VIEIRA, R.F. et al. (eds.). 2016. Espécies nativas da flora brasileira de valor econômico atual ou potencial: plantas para o futuro – Região Centro-Oeste. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, p.247-256.
Site Protection is enabled by using WP Site Protector from Exattosoft.com