Anadenanthera peregrina (L.) Speg.

Variedade peregrina

Sinônimo: Piptadenia peregrina (L.) Benth.

Variedade falcata (Benth.) Altschul

Sinônimos: Anadenanthera falcata (Benth.) Speg. e Piptadenia falcata Benth.

Angico, angico-vermelho, angico-jacaré, paricá

 Árvores inermes, caducifólias, heliófilas, monoicas, até 20 m de altura e 70 cm de DAP. Madeira pesada; cerne na maioria das vezes listrado, variando de róseo a avermelhado. Casca espessa; ritidoma suberoso, cinzento ou negro, com diversos padrões de divisão, às vezes com projeções semelhantes a grandes verrugas ou a acúleos, não raro com bolotas de goma na superfície; casca interna rósea na camada externa e brancacenta na interna. Folhas alternas, bipinadas, paripinadas, glabras ou pubescentes, com 7-35 pares de pínulas opostas; raque com 12-20 cm de comprimento; pecíolo com um nectário extrafloral; pínulas opostas, com nectários, 3-8 cm de comprimento e 20-60 pares de foliólulos opostos, lineares, de 2-8 x 1-2 mm. Inflorescência racemosa, pubérula ou glabra, formada por glomérulos globosos, pedunculados, brancos, com um invólucro – ou a cicatriz de um invólucro – próximo à base do pedúnculo; flores diclamídeas, pentâmeras, actinomorfas, andróginas, perfumadas, sésseis, com 4-6 mm de comprimento; cálice e corola campanuliformes; androceu diplostêmone; estames exsertos, livres; anteras eglandulares (examinar o botão floral). Fruto alongado, compresso, seco, deiscente, marrom ou cinzento, reto ou arqueado, constrito nas margens, com 10-25 x 1,5-2 cm, granuloso, sem (ou com raras) nervuras na superfície das lojas seminais. Sementes marrons, lisas, duras, circulares, estreitamente aladas, com 8-12mm de diâmetro.

Distribui-se do Haiti e República Dominicana, por grande parte das ilhas caribenhas e quase todo o norte da América do Sul, até o Paraguai e o Brasil. Tem sido assinalada para os estados do Amazonas, Roraima, Pará, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Goiás e o Distrito Federal, mas é provável que ocorra em outros estados das regiões Norte e Centro-Oeste. Habita florestas estacionais subcaducifólias e caducifólias e florestas ribeirinhas situadas em solos de média a alta fertilidade, que variam de incipientes a bem desenvolvidos. Ocorre em quase toda a área de abrangência do Cerrado, em grande parte das vezes em simpatria com A. colubrina var. cebil.

Perde a folhagem na estação seca; floresce com brotos e folhas novas, entre agosto e novembro; apresenta frutos maduros entre e julho e setembro. As flores são freqüentadas por uma grande diversidade de insetos, com destaque para abelhas, que aparentemente são os seus polinizadores e garantidores da formação de frutos. As sementes caem sob a planta-mãe, quando os frutos se abrem, mas às vezes são lançados para os arredores, por ventos fortes. Tem sido observado que em algumas localidades as sementes são fortemente predadas por bruquídeos e por algumas espécies de formiga.

A madeira das variedades de A. peregrina é utilizada em obras externas e internas; para confecção de móveis e objetos decorativos, dentre outros artefatos; como lenha para uso doméstico e produção de carvão; e para obtenção de cinzas para fabricação de sabão caseiro, em substituição à soda cáustica. A casca, devido ao seu alto teor de tanino, é usada em processos artesanais de curtimento de couros e por conter metabólitos bioativos, é utilizada na fitoterapia popular como cicatrizante e contra diarreia, blenorragia, sífilis, faringite, hiperglicemia e afecções renais, uterinas e das vias respiratórias. As bolotas de goma que se formam na superfície da casca também são usadas com essas finalidades e também por abelhas, para elaborar própolis. Essa goma entra na dieta de primatas do gênero Callithrix (soin, sagüi, mico), que a obtêm mediante perfurações no alto do tronco. As flores são fonte de néctar e pólen para diversas espécies de abelhas, inclusive para Apis mellifera, que quando as visitam com intensidade produzem mel aromático e saboroso. As sementes são usadas no preparo do yopo, um tipo de rapé usado como alucinógeno e remédio por várias tribos indígenas latino-americanas. A espécie vem sendo empregada em arborização urbana, recomposição de áreas desmatadas, implantação de sistemas agroflorestais e reflorestamentos para obtenção de madeira e de casca para extração de tanino. Alguns estudos indicaram que as suas radicelas se associam com bactérias fixadoras de nitrogênio atmosférico, o que acentua o seu potencial para utilização nesses desses sistemas.

As sementes de A. peregrina apresentam fraca dormência tegumentar e desta forma podem ser semeadas sem tratamentos pré-germinativos, apesar de tratamento simples, como imersão em água por 24-48 horas e escarificação com lixa de unha,  ajudarem na aceleração e uniformização da germinação. Na formação de mudas, deve-se utilizar sementes novas e colocá-las para germinar em sementeiras ou em recipientes de 25 x 15 cm contendo substrato organo-argiloso, expostos ao sol ou sob até 50% de sombreamento. A área de plantio definitivo das mudas pode ser ensolarada ou parcialmente sombreada, mas o solo deve ser, preferencialmente, de média a alta fertilidade.

As variedades de A. peregrina, assim como as de A. colubrina, abordadas em outro post deste trabalho, são mais frequentes em áreas preferenciais para atividades agropastoris, a maioria já muito degradadas, e ainda são objeto de corte para aproveitamento da madeira. Por outro lado, possuem ampla dispersão no Cerrado,  são encontradas também em áreas de preservação permanente (florestas ribeirinhas) e estão presentes em unidades de conservação de proteção integral nesse bioma.

Distinçao de A. colubrina

A. peregrina difere de A. colubrina, abordada em outro post deste trabalho, por apresentar anteras eglandulares, um invólucro (ou uma cicatriz de invólucro) próximo à base do pedúnculo e frutos de superfície granulosa, sem (ou com raras) nervuras sobre as lojas seminais.

Distinção das variedades

A diferença mais evidente entre as variedades de A. peregrina) está nos frutos, que são retos ou apenas ligeiramente curvos na variedade típica (peregrina) e tipicamente curvos na variedade falcata.

ComentárioOs trabalhos de Brandão (2015), Damacena et al. (2014), Mota et al. (2017) e Sartori et al. (2014), abaixo referenciados, indicam que a casca A. colubrina var. cebil contém substâncias que justificam alguns dos seus usos na fitoterapia popular e que, além disso, possuem metabólitos com propriedades antioxidantes, antimicrobianas, antitumorais e imunológicas.

 

Indivíduo com inflorescências e folhas novas. Piracanjuba (GO), 15-09-2016

Superfície do ritidoma. Campo Florido (MG), 29-08-2015

Cacho de inflorescências. Valparaíso de Goiás (GO), 28-09-2008

Frutos imaturos. Uberaba (MG), 22-09-2017

LITERATURA
ALTSCHUL, S.R. 1964. A taxonomic study of the genus Anadenanthera. Contributions from the Gray Herbarium of Harvard University, n.193, p.1-65, 1964.
ALTSCHUL, S.R. 1972. The genus Anadenanthera in amerindian cultures. Cambrige (USA): Havard University,  96 p.
BRANDÃO, M.G.L. 2015. Plantas úteis de Minas Gerais e Goiás: na obra dos naturalista. Belo Horizonte: Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG, 109 f.
CARVALHO, P.E.R. 1994. Espécies florestais brasileiras: recomendações silviculturais, potencialidades e uso da madeira. Colombo: EMBRAPA-CNPF; Brasília :EMBRAPA-SPI, v.1, 640 p.
CORDEIRO, L. & BELTRATI, C.M. 1989. Estrutura e desenvolvimento de nódulos radiculares de Anadenanthera falcata Speg. Revista Brasileira de Botânica, v.12, n.1/2, p.61-70.
DAMASCENA, N.P. et al. 2014. Antioxidant and orofacial anti-nociceptive activities of the stem bark aqueous extract of Anadenanthera colubrina (Velloso) Brenan (Fabaceae). Natural Products Research, v. 28, n.10,  p.753–756.
FERES, J.M. 2014. Diversidade genética, fluxo gênico e sistema de cruzamento de Anadenanthera colubrina  (Vell.) Brenan e Anadenanthera peregrina (L.) Speg.: duas espécies que ocorrem em alta densidade no interior do Estado de São Paulo. Tese (doutorado), Universidade de São Paulo, 162 p.
FRANCISCO T.M. et al. Feeding habits of marmosets: A case study of bark anatomy and chemical composition of Anadenanthera peregrina gum. Am J Primatol. 2017; 79:1–9.
GROSS, E. et al. 2004. Nodulação e micorrização em Anadenanthera peregrina var. falcata em solo de cerrado autoclavado e não autoclavado. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.28, n.1, p.95-101.
LORENZI, H. 1992. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. Nova Odessa (SP): Instituto Plantarum, v.1, 1a  352 p.
LORENZI, H. et  al. 2002. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas cultivadas. Nova Odessa (SP): Instituto Plantarum, 512 p.
MAIA G.N. 2012. Caatinga: árvores e arbustos e suas utilidades. Fortaleza: Printcolor Gráfica e Editora, 2a ed., 413 p.
MIRANDA, C.C. et al. 2012. Germinação de sementes de Anadenanthera peregrina (L.) Speg. com diferentes substratos em condições laboratoriais. Floreta e Ambiente, v.19, n.1, p.26-31.
MORI, C.L.S.O. 2003. Caracterização da madeira de angico-vermelho (Anadenanthera peregrina (Benth) Speng) para confecção de móveis. Brasil Florestal, v.22, n.77, p.29–36.
MORIM, M.P. 2020. Anadenanthera in Flora do Brasil 2020. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://floradobrasil.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB18075>. Acesso em: 26 dez. 2021.
MOTA, G.S. et al. 2017. Bark anatomy, chemical composition and ethanol-water extract composition of Anadenanthera peregrina and Anadenanthera colubrina. PLoS ONE, v.12, n.12, Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/m/pubmed/29281656/. Acesso em: 02 abr. 2018.
QUEIROZ, L.P. 2009. Leguminosas da Caatinga. Feira de Santana (BA): Universidade Estadual de Feira de Santa; Kew (UK): Royal Botanic Gardens.
RODD, R. 2002. Snuff synergy: preparation, use, and pharmacology of yopo and Banisteriopsis caapi among the Piaroa of southern Venezuela. Journal of Psychoactive Drugs, v.34, n.3, p.273–279.
SARTORI C.J. et al. 2014. Teores de fenóis totais e taninos nas cascas de Angico-vermelho (Anadenanthera peregrina). Floresta e Ambiente, v.21, n.3, p.394–400.
SILVA, R.S. 2010. Filogenia e filogeografia molecular de Anadenanthera Speg. Leguminosae (Mimosoideae). Tese (doutorado), Universidade Federal de Viçosa.
SILVEIRA, T.C. 2014. Estrutura e diversidade genética do gênero Anadenanthera Speg. (Leguminosae – Mimosoideae) estimadas com marcadores microssatélites. Dissertação (mestrado), Universidade Federal de Viçosa, 40 f.
TORRES, C.M. & REPKE, D.B. 2006. Anadenanthera: visionary plant of ancient South America. New York: Haworth Herbal, 340 p.
Site Protection is enabled by using WP Site Protector from Exattosoft.com